quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Antonio Barreto

O baiano Antonio Barreto é considerado atualmente um dos maiores nomes do cordel no Brasil. Preocupado com as causas de seu tempo, o autor não poupa críticas aos políticos brasileiros , bem como, artistas e programas da grande mídia. O cordel Big Brother Brasil: um programa imbecil  teve grande repercussão no país. Em entrevista ao ECL Bertold Brecht o cordelista nos contou sobre seus projetos.
                                
                 
Arquivo pessoal de Antonio Barreto

ECL- De que forma, projetos, tais como: “Leituras públicas” podem contribuir para a aproximação dos leitores ao universo do cordel?
ANTONIO BARRETO - Pois é, a tarefa de formar leitores não é só responsabilidade da escola, mas de todos nós: família, mídia, poetas, formadores de opinião em geral. E Leituras Públicas, aqui em Salvador, é um projeto da Fundação Pedro Calmon, cujo objetivo é estimular a difusão do livro, o gosto pela leitura e o incentivo à produção cultural. São encontros mensais com autores locais em que se promove o diálogo do leitor com texto. Eu fui um dos convidados este ano (2013) e ali tive a oportunidade de mostrar um pouco de minha produção com o lançamento de uma coletânea que reúne 11 folhetos de cordel, intitulada “Big Brother Brasil: um programa imbecil e outros cordéis”, que faz parte de um outro projeto da Fundação Pedro Calmon.

ECL-O cordel Big Brother Brasil: um programa imbecil espalhou-se rapidamente por todo o país. Conte-nos como foi o processo de criação daquilo que ficou conhecido como uma valiosa crítica ao entretenimento da grande mídia?
ANTONIO BARRETO - O processo de criação do cordel do BBB se deu de uma forma curiosa! Eu estava num barzinho com amigos poetas dialogando sobre os rumos da poesia aqui em nossa terra. De repente, uma voz do “além” tocou a minha consciência dizendo: “Big brother Brasil – Um programa imbecil” !  De pronto fiz a anotação do título do referido cordel em um guardanapo, mas a construção do texto só veio a acontecer depois de alguns meses. Após a conclusão, enviei o texto para um casal amigo em BH (Paulo e Nívea) e eles divulgaram na Internet. A partir daí foi um sucesso que não teve fim. Até hoje recebo congratulações de um mundaréu de pessoas de todos os recantos do planeta azul !

ECL-Em tempos em que “a arte pela arte” domina os meios de comunicação numa profusão ilimitada de espetacularização. Como você avalia o papel do artista popular?
ANTONIO BARRETO - A verdadeira arte precisa estar engajada com o social. E o papel do artista popular é estar presente em todos os espaços da mídia, mas visando sempre uma contribuição maior para embelezar a vida. No caso do cordelista, o ideal seria uma criação artística visando a formação de um leitor crítico que seja capaz de interagir habilmente no seio da sociedade. Não vale a pena escrever cordel por escrever, por curiosidade; o  verdadeiro cordelista precisa se empenhar bastante, ter persistência e dialogar com o seu leitor, tendo a consciência de  que a nossa produção deve estar seriamente relacionada com o contexto social, cultural, político e econômico do qual estamos inseridos. De modo que fico entristecido ao ver tanta banalização da arte no momento atual.

ECL-Como os professores do Brasil podem usar o cordel como um “instrumento pedagógico”?
ANTONIO BARRETO - Da mesma forma que utilizamos outros gêneros textuais, a exemplo do conto, crônica, poesia, romance, letra de música etc. O ideal seria o MEC estabelecer uma lei que oficializasse o ensino do cordel na grade curricular do ensino médio e fundamental. E não é fácil aproximar o aluno do livro, já que os instrumentos tecnológicos atuais são extremamente sedutores. A literatura de cordel indiscutivelmente é um gênero textual muito significativo, sedutor, carregado de ludicidade, que tem o poder de desenvolver nos alunos o senso crítico, o gosto pela leitura, o raciocínio lógico. Aqui em Salvador e em todo o estado da Bahia as escolas, tanto particulares quanto públicas, seguem empenhadas na utilização do cordel como um instrumento pedagógico capaz de nos auxiliar no processo de ensino aprendizagem. Eu, por exemplo, venho há 10 anos realizando oficinas de cordel em todo o estado, experiência esta carregada de  êxito.

ECL- Quais são os próximos projetos do artista Antonio Barreto?
ANTONIO BARRETO - Olha, Juliana, tenho um mundo todo de projetos, mas no momento estou podendo falar  apenas de dois!  O primeiro vai acontecer em 2014, que é a publicação de um livro em que reunirei 21 cordéis de minha autoria relacionados à educação, ou seja, cordéis que foram feitos a partir da experiência prática com os meus alunos. O segundo é para 2015, que é uma abordagem sobre os períodos literários ocorridos no Brasil. Inclusive já tenho prontos: “Aula de Quinhentismo em cordel”, “Aula de Barroco em cordel” e “Aula de Arcadismo em cordel” - esses dois últimos serão lançados agora em novembro, na Bienal 2013, aqui em Salvador. No mais seguirei fazendo minhas oficinas de cordel, palestras e recitais. Ah sim, acabei de fazer um cordel esta semana ,mas estou com receio de publicar ! O título é “A Fazenda da Record – um programa de dar dó.” Quer dizer, eu ando meio receoso com relação a essa crítica social que venho fazendo através do cordel. O fato é que tanto o cordel do Pedro Bial quanto o de Caetano Veloso me deram muita dor de cabeça! Agora sinto uma necessidade enorme de fazer silêncio e seguir com a minha produção voltada para a educação, ecologia e cultura popular. A Bahia continua conservadora, talvez o Brasil por inteiro. Veja que os poetas Gregório de Matos e Cuíca de Santo Amaro foram condenados pela sociedade por terem a verve crítica. Dizem muito por aí que é proibido proibir – mas tenho dúvidas disso! Ainda bem que não sou famoso e ninguém vai se preocupar em me biografar ! Passei a praticar meditação e começo a descobrir o quanto somos limitados, idiotas e pequenos diante desse universo complexo chamado vida humana...
 Trecho do cordel Big Brother Brasil: um programa imbecil:

Curtir o Pedro Bial
E sentir tanta alegria
É sinal de que você
O mau gosto aprecia
Dá valor ao que é banal
É preguiçoso mental
E adora baixaria.

Há muito tempo não vejo
Um programa tão "fuleiro"
Produzido pela rede Globo
Visando Ibope e dinheiro
Que além de alienar
Vai por certo atrofiar
A mente do brasileiro.

Me refiro ao brasileiro
Que está em formação
E precisa evoluir
Através da Educação
Mas se torna um refém
Iletrado, "zé-ninguém"
Um escravo da ilusão.





Trecho do cordel: Esse cara sou eu: Renan Calheiros!

- Deitadinho numa rede
 Como um bom samaritano
O Renan vai criar boi
No sertão alagoano
E doar filé mignon
Porque é um cabra humano!

-Ficha suja no Brasil

Não paga pelo que fez...
A justiça silencia,
O cabra faz outra vez...
Mas o pobre logo é preso
Roubando um pinto pedrês!

- A vitória do Renan

Me deixou desnorteado...
Todo o "acerto" em Brasília
Foi deveras camuflado:
Uma eleição secreta
Pra eleger um condenado!



Alguns trabalhos de Antonio Barreto estão em:

http://barretocordel.wordpress.com/

Abraços,
Juliana Gobbe